Crispim Mira

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Crispim Mira
Nascimento 13 de setembro de 1880
Joinville
Morte 5 de fevereiro de 1927 (46 anos)
Florianópolis
Causa da morte assassinato
Nacionalidade Brasileiro
Progenitores Pai: Crispim Antônio de Oliveira Mira
Cônjuge Olindina de Mira
Ocupação jornalista, escritor e advogado
Gênero literário Jornalismo crítico
estudos geográficos

Crispim Mira (Joinville, 13 de setembro de 1880Florianópolis, 17 de fevereiro de 1927) foi um jornalista, escritor e advogado brasileiro que atuou na imprensa do Estado de Santa Catarina e do Rio de Janeiro no início do século XX. Interessado em geografia, estudioso sobre assuntos culturais e políticos catarinenses, escreveu vários livros que retratavam os costumes e a organização social da região catarinense da época.

Mediante as denúncias que fazia veicular em suas matérias jornalísticas, nas quais questionava e indicava irregularidades na administração pública, foi assassinado em 1927, em sua sala de trabalho.

Biografia[editar | editar código-fonte]

Filho de Crispim Antônio de Oliveira Mira, nasceu em Joinville em 13 de setembro de 1880.[1] Mesmo nunca tendo concluído o ensino formal, foi considerado um brilhante escritor, tendo assumido diferentes funções em diversos jornais e escrito uma série de livros.[2] Em 1899, aos 19 anos, Crispim Mira já era um dos redatores da "Gazeta de Joinville", dirigido por Eduardo Schwartz. Algum tempo depois passou a colaborar com artigos publicados no Rio de Janeiro, na época capital do Brasil, indo para o Rio em 1901, para fazer o curso de Direito. Sem completar os estudos, regressou a Joinville, fundou o seu primeiro jornal, o “Jornal do Povo”. Transferiu-se posteriormente para Florianópolis, onde passou a exercer o jornalismo e a advocacia, chegando a ser dono de vários pequenos jornais. Era um jornalista que causava polêmica, denunciando continuamente a má administração pública.[3]

Em 1908, foi convidado a assumir o cargo de redator da “Gazeta Catharinense”, jornal do então senador Hercílio Luz. Um ano depois, fundou a “Folha do Commercio”, onde começou a fazer críticas à administração federal e a denunciar o abandono do porto de Florianópolis, tanto que, em 1912, seus artigos no jornal “Folha do Commercio” influenciaram o já então governador Hercílio Luz na assinatura de um acordo que fixava as fronteiras entre Santa Catarina e Paraná, acabando com a longa disputa de limites entre os dois estados.

Em 1918, foi co-fundador e redator do jornal “Terra Livre”, em Florianópolis, mas a publicação foi destruída por um incêndio. Entre 1919 e 1920 se incorporou ao jornal oficial “República”, que pertencia ao governo Hercílio Luz. Em 1924, voltou para Joinville, onde trabalhou como advogado e colaborou com os jornais “Correio de Joinville” e “A Notícia”. Em 1926 voltou para Florianópolis e fundou “Folha Nova”, seu último jornal.[4]

Tendo grande interesse pela geografia, participou de Congressos em diferentes capitais brasileiras, e escreveu várias obras sobre o assunto, podendo ser considerado um geógrafo, mediante seus estudos populacionais, sociais culturais e territoriais. Mediante sua produção literária, tornou-se sócio correspondente da Academia Mineira de Letras e do Centro Matogrossense de Letras.[5] Foi sócio do Centro Catarinense de Letras.[3]

Crispim também trabalhou como advogado “provisionado”, “espécie de profissional autorizado a exercer a advocacia de forma limitada, mesmo sem cursar alguma Faculdade de Direito”, publicando algumas obras de cunho jurídico.[6]

Combativo e denunciador, foi morto em decorrência das denúncias feitas semanas antes de sua morte, sobre irregularidades em obras federais do porto, em Florianópolis.[3] A edição de “Folha Nova” datada de 15 de fevereiro de 1927 estampava em grandes títulos: “História de uma Repartição Pública Federal onde Alguns Enriquecem e Outros se Locupletam até a Indigestão”. O jornalista escreveu artigos em que questionava a lentidão com que a Ministério da Viação, a “Commissão de Melhoramentos do Porto”, cujo diretor era Tito Lopes e que estava vinculada ao Ministério da Viação, tratava do aumento do porto de Florianópolis – que, por ser limitado, obrigava as embarcações a atracarem na ilha de Ratones, na Baía Norte[4] de Florianópolis.

Quando começaram a ser publicadas tais denúncias sobre a Commissão de Melhoramentos dos Portos em Florianópolis, Tito Lopes chegou a desafiar o jornalista para um duelo, atitude que foi muito criticada pelos jornais da época, pois o duelo já era prescrito como crime no Código Penal então em vigor.[7] Crispim Mira respondeu que “acceitaria o desafio para um duello a penna”, ou seja, ofereceu o seu próprio jornal para servir de palco “(...) para o unico duello compatível com a civilisação brasileira, - o da discussão pela imprensa, e o do julgamento pelo tribunal recto e inflexivel da opinião publica”.[8]

Crispim morreu assassinado em sua sala de trabalho, onde era diretor e proprietário do jornal “Folha Nova”,[4] de Florianópolis, em 5 de março de 1927.[4] Em 17 de fevereiro de 1927, estava acompanhado do filho Cláudio, de 14 anos, e do redator, Petrarcha Callado,[2] quando entraram em sua sala vários homens armados com chicotes e revólver, e atiraram em sua boca.[4] O grupo de homens que atacou Crispim Mira era composto por Aecio Lopes, Antonio Selva, Sebastião Coelho e João Pio Pereira; um deles, Aecio Lopes, era filho de Tito Lopes, que fora duramente criticado nos editorias de “Folha Nova”.[4]

Após ser hospitalizado por 16 dias no Hospital de Caridade, em Florianópolis, com uma bala alojada entre a primeira e terceira vértebras, faleceu em 5 de março de 1927, às 4 horas e 40 minutos.[9] Crispim era casado com Olindina de Mira e deixou quatro filhos.[5]

Repercussão[editar | editar código-fonte]

"Preferimos informar a comentar, preferimos elogiar a censurar, mas não elogiaremos o erro, nem censuraremos o bem. Em qualquer caso, desejamos ser, sempre, oportunistas, tolerantes e cortezes. Temos um horizonte: a bondade, o affecto ou o cavalheirismo em todas as emerjencias e o jubilo da vida em todas as situações. É nosso ideal congraçar, construir, resistir á treva e homenagear a luz. Dê-nos o povo, seu amparo, e certo que não sossobraremos em meio da jornada".
Crispim Mira, Florianópolis, Folha Nova, 18 de novembro de 1926, Ano I, N. I.[4]

Assim escrevendo, em 18 de novembro de 1926, no primeiro exemplar do seu Jornal “Folha Nova”, em Florianópolis, Crispim Mira definiria o seu profissionalismo, sua filosofia e sua meta de trabalho. Bastante conhecido e respeitado, sua morte teve grande repercussão na imprensa catarinense e brasileira, causando forte comoção popular. Em Florianópolis, que na época possuía uma população de 40 mil habitantes, dez mil pessoas acompanharam o enterro.[10]

O processo criminal sobre o assassinato de Crispim Mira foi um dos mais rumorosos já registrados na Capital do Estado de Santa Catarina, sempre acompanhado pela imprensa.[3] Aécio Lopes e seus acompanhantes foram julgados na comarca de São José, município vizinho, mas que na época do crime não tinha nenhuma ligação com Florianópolis, em 28 de setembro de 1927, e foram absolvidos, assim como o processo foi extraviado.[4]

Enéas Athanázio, em seu livro “Jornalista por ideal - Algumas considerações sobre um catarinense esquecido” (1992), observou que “na coleção da “Folha Nova” correspondente aos anos de 1926 e 1927, existente na Biblioteca Pública do Estado, não se acham os jornais de 25 de janeiro a 2 de maio de 1927, justamente o período em que ocorreram os fatos que culminaram com a morte do jornalista (números LVI a 138). É claro que outros jornais trataram do assunto, e muito, mas a versão das vítimas desapareceu. Terá sido coincidência ou tentativa de esconder os fatos?”.[6]

Segundo o jornalista Fernando Jorge, em seu livro “Cala a boca, jornalista!”, todos os acusados ficaram impunes e sobre o crime “pesa o mais tumular silêncio”.[11]

Obras literárias[editar | editar código-fonte]

  • 1905 - Crispim fez um ensaio sobre a Colônia Dona Francisca, em Santa Catarina.
  • 1909 - “Município de Joinville”.[10]
  • 1917 - "Crimes e Aventuras dos Irmãos Brocato", relato verídico, conta a história de Thomaz e Domingos Brocato, dois criminosos sicilianos que passaram por Buenos Aires, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Caxias e tiveram um final trágico em Lages, SC.[4]
  • 1919 - "Os Alemães no Brasil" demonstra a contribuição dos alemães residentes no Brasil para o desenvolvimento nacional, não representando nenhum perigo para o país. O livro foi escrito durante a Primeira Guerra Mundial.[4]
  • 1919 - "Acorda Brasil" apresenta artigos em que expõe as idéias do autor para o desenvolvimento nacional. No livro, defende que "o homem que produz é o único que tem valor, e as sociedades que não desejam iludir-se devem julgar os seus contemporâneos por aquilo que sejam e não pelo que procuram fazer crer que são".[4]
  • 1920 - "Terra Catharinense", um estudo sobre Santa Catarina e sua potencialidade. Originalmente uma tese de 300 páginas, apresentada no 6º Congresso Brasileiro de Geografia,[2] em Minas Gerais, trata de temas polêmicos como a questão de limites entre Paraná e Santa Catarina, a colonização italiana e alemã, o ensino das línguas alemã e italiana nas escolas locais. Descreve a então chamada “revolta dos fanáticos”, mais tarde conhecida como Guerra do Contestado, e faz uma comparação com Canudos. Descreve, também, alguns tipos catarinenses, descrevendo a mulher, o homem do litoral e da serra, o pescador e a benzedeira.[4] Foi reeditado em 2008, pela Pzz Editora.[12]
  • 1924 - "Situação financeira e política de Santa Catarina",[10] um “libelo contra o governo de Hercílio Luz e seu sucessor”.[5]
  • Colaboração nos jornais “O Brasil” e “Correio da Manhã”, do Rio de Janeiro, além dos jornais catarinenses “Gazeta Catharinense”, “Folha do Commercio”, “República”, “A Notícia” e “Folha Nova”.
  • Ensaios jurídicos publicados em opúsculos: “Ação de Indenização”, “Ação de Manutenção”, “Hábeas corpus” e “Suspeição”.[5]

Homenagens e legado[editar | editar código-fonte]

  • Na bibliografia de Crispim Mira contam-se 18 obras, entre livros e plaquetas, sendo 14 literárias e 4 jurídicas.[5]
  • O escritor Monteiro Lobato o elogiou em dois ensaios seus, no volume "A Onda Verde", de suas "Obras Completas".[10][5]
  • Crispim é o Patrono da Cadeira nº 5 da Academia Catarinense de Letras.
  • Atualmente, há uma rua em Florianópolis que leva o nome do jornalista.
  • Foi produzido um documentário, "Crispim Mira e o Artigo da Morte", por Ernesto São Tiago. Foi exibido em 5 de março de 2009, no Cine Clube Sol da Terra, em Florianópolis.

Referências bibliográficas[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. Há duas datas de nascimento em diferentes fontes: 14 de maio (ATHANÁZIO, 1992, p. 7) e 13 de setembro (DOMINGOS, 2005).
  2. a b c HENTZ, Isabel Cristina. “A morte do jornalista mártir” - reflexões sobre a repercussão do atentado a Crispim Mira, UFSC.
  3. a b c d «A Notícia, Joinville, 9 de março de 2001». Consultado em 15 de fevereiro de 2013. Arquivado do original em 3 de março de 2016 
  4. a b c d e f g h i j k l DOMINGOS, Sabrina. Rede Alcar Arquivado em 3 de março de 2016, no Wayback Machine., Ano 5, N. 56 - 01 de outubro de 2005.
  5. a b c d e f ATHANÁZIO, Enéas. Oitenta Anos de Silêncio, Coojornal Rio Total. N. 593, 2008
  6. a b ATHANÁZIO, Enéas. “Jornalista por ideal - Algumas considerações sobre um catarinense esquecido: Crispim Mira”. Edição do Autor, Fundação Casa Dr. Blumenau, 1992. p. 9.
  7. A Noticia, Joinville, publicado no Folha Nova em 24/02/1927. p. 2. In: HENTZ, Isabel Cristina. A morte do jornalista mártir” - reflexões sobre a repercussão do atentado a Crispim Mira, UFSC, 2008. p. 6
  8. O Dia, Curitiba, publicado no Folha Nova em 23/02/1927. p. 2. In: HENTZ, Isabel Cristina. “A morte do jornalista mártir” - reflexões sobre a repercussão do atentado a Crispim Mira, UFSC, 2008. p. 6
  9. Folha Nova, 5 de março de 1927. In: HENTZ, Isabel Cristina. A morte do jornalista mártir” - reflexões sobre a repercussão do atentado a Crispim Mira, UFSC, 2008.
  10. JORGE, Fernando. Cala a Boca, Jornalista”. São Paulo: Editora Vozes. 4. ed., 1992. p. 182. In: ATHANÁZIO, Enéas. Oitenta Anos de Silêncio, Coojornal Rio Total. N. 593. 2008
  11. Terra Catarinense, Google Books

Ligações externas[editar | editar código-fonte]


Precedido por
ACL - patrono da cadeira 5
Sucedido por
Leopoldo de Diniz Martins Júnior
(fundador)
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